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O Elo Perdido da Compostagem Termofílica Industrial: Valorização do Serviço de Tratamento e Transformação de Resíduos Orgânicos

  • Foto do escritor: Associação Brasileira de Compostagem
    Associação Brasileira de Compostagem
  • 31 de jul.
  • 4 min de leitura

Com mais de 30 anos de atuação na gestão e valorização de resíduos orgânicos, especialmente lodo de esgoto e resíduos agroindustriais, tenho acompanhado de perto a evolução da compostagem termofílica no Brasil. Minha trajetória inclui participação ativa na construção do marco regulatório nacional junto ao CONAMA, CETESB e Ministério da Agricultura e Pecuária, o que me permite hoje fazer um balanço crítico e construtivo ao setor.

lodo da industria de alimentos

Atualmente, a vasta maioria das empresas do segmento se autodefine como "indústrias de fertilizantes orgânicos e condicionadores de solo". Essa abordagem as leva a aceitar resíduos de terceiros a custos relativamente baixos, como se fossem insumos convencionais, quando na verdade são materiais que exigem tratamento técnico, manejo adequado e, frequentemente, balanceamento no processo natural de blendagem.


Negligenciar os custos envolvidos nessa etapa compromete a viabilidade do negócio e desvaloriza o relevante serviço prestado pela compostagem.

A agricultura brasileira, embora pujante, é intrinsecamente cíclica e sujeita aos altos e baixos da conjuntura geopolítica e econômica. Tradicionalmente mineralista, ela recorre aos fertilizantes orgânicos e condicionadores de solos apenas quando o mercado está favorável, não os tratando como insumos essenciais.


A sazonalidade dos cultivos, somada à volatilidade dos preços dos fertilizantes minerais — influenciados por fatores internacionais como crises logísticas, conflitos armados e variações cambiais —, torna o mercado agrícola um terreno instável. Essa dependência acentuada das flutuações de demanda e preço expõe o modelo de negócio vigente das compostagens a vulnerabilidades significativas.


Nossa indústria de compostagem clama por uma nova visão de mercado. Precisamos urgentemente valorizar a essência da nossa atividade: os serviços de tratamento de resíduos. 

Minha forte impressão é que a nossa indústria de compostagem clama por uma nova visão de mercado. Precisamos urgentemente valorizar a essência da nossa atividade: os serviços de tratamento de resíduos. Somos agentes fundamentais da economia circular, responsáveis pelo aproveitamento de materiais que, de outra forma, sobrecarregariam aterros sanitários ou gerariam impactos ambientais negativos causados por descartes inadequados.


É inegável a contribuição ambiental da indústria da compostagem: essas empresas transformam passivos em ativos, mitigam emissões e devolvem matéria orgânica, nutrientes e microrganismos benéficos ao solo de forma sustentável. Além disso, a preocupação com a qualidade e segurança dos insumos agrícolas obtidos é e deve ser uma prioridade inegociável.


No entanto, tenho a sensação de que, na corrida para vender seus produtos, as empresas do segmento acabam desvalorizando o serviço fundamental que oferecem aos geradores de resíduos. Esse serviço, intrinsecamente ligado à sustentabilidade ambiental e à gestão responsável de materiais, merece ser reconhecido e precificado de forma justa.

Consideremos alguns desafios inerentes ao tratamento de resíduos orgânicos, como o elevado teor de água. Resíduos como lodo de esgoto e lodos diversos de tratamento de efluentes industriais e agroindustriais chegam à compostagem com umidade média de 80% ; outros resíduos, como restos de alimentos inservíveis pré e pós-consumo, apresentam teores de água superiores a 90%, o que significa que grande parte da massa recebida é composta apenas por água — e menos da metade das massas processadas se converte, de fato, em produto acabado.


Adicionalmente, a concorrência de estercos de aves e bovinos confinados — cuja geração e comercialização não estão sujeitas às mesmas exigências legais de licenciamento ambiental e das normativas do Ministério da Agricultura e Pecuária — impõe uma distorção de mercado. A geração é amplamente dispersa, e o cliente muitas vezes encontra uma granja próxima oferecendo esterco cru a custos inferiores, sem os controles sanitários, ambientais e de qualidade exigidos das empresas de compostagem, que arcam com investimentos e responsabilidades significativas para operar legalmente.


É fundamental destacar que o pleno atendimento às exigências ambientais para licenciamento – que incluem uma gestão rigorosa da geração de odores, a proteção dos recursos ambientais no entorno da planta de compostagem e a pacífica coexistência com as populações circunvizinhas – demanda investimentos pesados por parte do empreendedor.


trator revirando uma leira de compostagem

A saúde financeira da atividade, como em qualquer outro negócio, é primordial para a viabilidade e perenidade de qualquer empreendimento neste setor. Além disso, a compostagem desempenha uma importante função socioambiental, garantindo um destino sustentável aos resíduos gerados pela promoção do “bem-estar” das populações, preservando recursos naturais, e gerando empregos e divisas para o Estado, contribuindo diretamente para o desenvolvimento local e a qualidade de vida.

Empresários do setor de compostagem: é imperativo que reavaliemos nosso modelo de negócio! Não somos apenas fábricas de adubo! Somos, antes de tudo, solucionadores de problemas ambientais, parceiros estratégicos na gestão de resíduos e promotores da economia circular.


É crucial entender que aterros sanitários são espaços cada vez mais nobres no Brasil e no Planeta. Resíduos com qualquer potencial de aproveitamento para compostagem e obtenção de insumos agrícolas, que atendam aos requisitos ambientais em vigor, devem, de forma preferencial, ser destinados por seus geradores às empresas de compostagem. Isso não é apenas uma questão de sustentabilidade ambiental, mas também de racionalidade econômica e gestão eficiente de recursos.


A valorização do serviço de tratamento de resíduos deve se tornar um pilar central de nossa estratégia de precificação e posicionamento no mercado. Ao fazê-lo, não só garantiremos uma maior estabilidade econômica para nossos empreendimentos, desvinculando-nos excessivamente das flutuações do mercado agrícola, mas também reforçaremos nossa identidade como agentes de transformação ambiental.


Vamos focar na entrega de valor completo: desde a solução ambiental robusta e certificada para os geradores de resíduos até a produção de insumos agrícolas de alta qualidade. É essa visão integrada que garantirá a sustentabilidade e o reconhecimento que nossa indústria merece.


Por: Fernando Carvalho Oliveira, Associado da AB|Compostagem


 
 
 

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